Abismo salarial separa negros e brancos nas relações laborais

Dados mostram como o Brasil ainda precisa avançar na pauta da igualdade racial. MPT reforça ações afirmativas voltadas à inclusão de pessoas negras no mercado de trabalho

20/11/2019 - A data de 20 de novembro é lembrada em todo o território como Dia Nacional da Consciência Negra. O Brasil é o segundo país em população negra no mundo - 55,8% das pessoas são negras e pardas, porém a representatividade no mercado de trabalho ainda é baixa. Somente 29,9% dos cargos gerenciais são exercidos por elas. Quanto mais alto o salário, menor é o número de pessoas pretas e pardas a ocuparem esses postos. As informações estão na pesquisa Desigualdades Sociais por Cor ou Raça, publicada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) este mês.

O estudo mostra, ainda, que, em 2018, as mulheres negras receberam, em média, menos da metade dos salários dos homens brancos (44,4%) – no topo da escala de remuneração no país. Atrás deles, estão as mulheres brancas, que possuem rendimentos superiores não apenas aos das mulheres pretas ou pardas, como também aos dos homens pretos ou pardos.

Para reforçar a importância da promoção da inclusão das pessoas negras no mercado de trabalho, o Ministério Público do Trabalho (MPT) lançou no último dia 6 a campanha “Nosso lugar é legítimo. Racismo é não reconhecer”, que tem como foco a divulgação do Estatuto da Igualdade Racial para a população brasileira e o combate ao racismo estrutural existente no país. O objetivo é realçar que a discriminação se reflete nas condições de acesso ao trabalho e renda da população negra e que as ações afirmativas buscam corrigir essas desigualdades históricas.
 
Nos últimos cinco anos, foram recebidas 896 denúncias pelo MPT por discriminação em razão da origem, raça, cor ou etnia. Apesar da subnotificação em 2018, o número chegou a 205 denúncias, que correspondem a um crescimento de 30,5% em relação a 2014, quando foram recebidas 157 reclamações pertinentes ao tema.

O Ministério Público do Trabalho lembra que ações para a promoção da igualdade racial na vida econômica, social, política e cultural do país são direitos assegurados à população negra (artigo 4º do Estatuto da Igualdade Racial) e fundamentais para a construção de uma sociedade livre, justa, plural e igualitária.

A luta pelo combate ao racismo também reivindica um mercado de trabalho justo em oportunidades, como é garantido pelo Estatuto da Igualdade Racial. É direito da população negra o ingresso no mercado de trabalho com igualdade de oportunidades e representatividade nas mais diversas áreas e posições.

Para a procuradora Valdirene Silva de Assis, coordenadora nacional de Promoção da Igualdade de Oportunidades e Eliminação da Discriminação no Trabalho (Coordigualdade), do MPT, “é preciso criar condições para superar o racismo estrutural que impede as pessoas negras de alcançarem melhores postos de trabalho, com maior igualdade salarial”. Em regra, o racismo estrutural e institucional é fundado em preconceitos e estereótipos, que põem dúvidas e desrespeitam a ocupação desses lugares.
 
Representação racial

No ano passado, o MPT criou o Grupo de Trabalho de Raça, da Coordigualdade, que teve como uma das atuações mais marcantes o envio de notificações a emissoras de TV para cobrar delas a devida representação racial em sua grade de programação.

Outra iniciativa da Coordigualdade é o Projeto Nacional de Inclusão de Jovens Negras e Negros no Mercado de trabalho, que já gerou pelo menos três Pactos pela Inclusão Social de Jovens Negras e Negros no Mercado de Trabalho, firmados com participação das unidades do MPT em São Paulo, no Paraná e no Distrito Federal.

As questões raciais também são discutidas no Fórum de Prevenção e Combate à Discriminação Racial no Trabalho, com a participação do MPT, em São Paulo. Desses debates, surgiu o Canal Preto, lançado no fim do ano passado em parceria com a Organização Internacional do Trabalho e apoio da ONU Mulheres. O canal serve para dar voz a influenciadores, personalidades e cidadãos negros, bem como para discutir políticas públicas relativas às questões raciais.

Casos emblemáticos

Em 2013, o hipermercado Walmart foi condenado a pagar R$ 22,3 milhões por dano moral coletivo devido à prática de discriminação e assédio moral contra funcionários, ex-empregados e promotores de vendas. A decisão resulta de recurso do MPT no Distrito Federal que questionava sentença de primeira instância, a qual havia julgado improcedente a ação contra a rede de supermercados.

Em Mato Grosso do Sul, uma ação ajuizada em 2014 contra uma construtora de Campo Grande buscou reparar discriminação praticada em face de trabalhadores haitianos. Conforme apurado, os estrangeiros vieram do Estado do Acre após negociação prévia entre um engenheiro da construtora e a proprietária de uma empresa fornecedora de mão de obra. No entanto, um outro engenheiro assumiu a supervisão das atividades e teria impedido a entrada e o labor dos haitianos no canteiro de obras.

O caso foi encerrado depois da homologação de acordo judicial em que a construtora concordou com o pagamento de R$ 20 mil a título de dano moral coletivo, destinados posteriormente à unidade de prevenção do Hospital do Câncer de Barretos em Campo Grande. Outros R$ 10 mil foram revertidos na confecção de material institucional com o objetivo de facilitar o acesso de cidadãos a informações sobre direitos e deveres.

Ainda no estado, outras empresas do ramo de empreendimentos imobiliários foram denunciadas nos Municípios de Três Lagoas e Sidrolândia por episódios de racismo e de assédio moral no ambiente laboral. Fatos envolvendo condutas de racismo em supermercado, hotel e loja de confecções também chegaram ao conhecimento da instituição nos últimos anos.  

"A atuação investigativa ou promocional do MPT busca garantir que a igualdade prevista no texto constitucional não seja letra morta nas relações de trabalho. É dever de todo empregador respeitar as diferenças, sem qualquer discriminação, adotando medidas para que trabalhadores e trabalhadoras tenham as mesmas condições e oportunidades nas relações laborais, a despeito de cor, nacionalidade, gênero, entre outras formas de discriminação", sublinhou a titular da Coordigualdade no estado, procuradora Priscila Moreto de Paula.

Dia Nacional da Consciência Negra

Criada há oito anos, a data relembra a inclusão da população negra na sociedade brasileira e o fim da escravidão no Brasil, fazendo referência ao dia da morte de Zumbi dos Palmares, um dos mais importantes líderes negros que lutou contra o sistema escravista. Entre outras questões, a data também suscita o debate sobre racismo, discriminação, intolerância religiosa, igualdade social e valorização da cultura afro-brasileira.

Dados oficiais

- Brasil é o segundo país em população negra no mundo – 55% das pessoas são negras e pardas, mas os trabalhadores brancos recebem, em média, 74% a mais que elas (PNAD-IBGE, 2015).

- Somente 29,9% dos cargos gerenciais são exercidos por negros e pardos (Pesquisa IBGE, 2019).

- Em 2018, mulheres negras ganharam, em média, 44,4% dos salários dos homens brancos – no topo da escala de remuneração no país (Pesquisa IBGE, 2019).

- Nos últimos cinco anos, foram recebidas 896 denúncias pelo MPT por discriminação em razão da origem, raça, cor ou etnia.

- Em Mato Grosso do Sul, a remuneração média dos homens negros é R$ 2 mil e das mulheres negras é R$ 1,7 mil (RAIS, 2017).  

- Em Mato Grosso do Sul, 32,8% dos negros ocupam cargo de direção (Censo IBGE, 2010).
   
Fontes: Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso do Sul e Procuradoria-Geral do Trabalho
Informações: (67) 3358-3035
www.prt24.mpt.mp.br | twitter: @MPT_MS

Tags: Ministério Público do Trabalho, Coordenadoria de Promoção de Igualdade de Oportunidades e Eliminação da Discriminação no Trabalho , condições de trabalho

Imprimir