"Existe trabalho escravo na moda. E aí, você vai compactuar ?", diz Astrid Fontenelle

Debates e exposição interativa promovidos pelo MPT para sensibilizar a sociedade acontecem até amanhã (23) na capital paulista, durante semana da moda. Ação faz parte do projeto de erradicação do trabalho escravo e integra a campanha Somos Livres

Brasília, 22/10/2018 - A informação como base para um consumo consciente na moda e produção de roupas sem uso de trabalho análogo ao escravo. Esse é o mote principal do evento que acontece até amanhã em São Paulo, entre pessoas ligadas à moda, procuradores e especialistas, em ação promovida pelo Ministério Público do Trabalho. Além de mesas de debates, o evento tem uma parte interativa, aberta ao público, com uma instalação na Casa Paulista 1811 simulando uma fábrica têxtil que revela as condições precárias às quais os trabalhadores são submetidos. As atividades serão encerradas nesta terça-feira, dia 23.

Uma das coordenadoras das mesas de debates que acontecem desde sexta-feira (19), a apresentadora Astrid Fontenelle conclamou os cidadãos a se engajarem nesta luta e a não compactuar com quem explora trabalhadores nessa área. "Existe trabalho escravo na moda. E aí, vocês vai compactuar? A educação é a base de tudo, inclusive a educação do consumidor. A população tem que tomar essa causa para si", resumiu Astrid ao final da primeira mesa de discussão.
 
A procuradora do MPT Catarina von Zuben, à frente da Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conaete), também enfatizou a importância de garantir informação sobre a questão. Ela relatou que nem sempre a pessoa que está nesta situação tem consciência de que é trabalho escravo. "Nem sempre quando a fiscalização chega, a situação é vista pela pessoa (que está trabalhando) como degradante, porque muitas vezes ela vive em uma situação pior. A remuneração é ínfima, ela ganha centavos mas, se erra, há desconto no valor integral da peça, criando uma servidão por dívida que não tem fim", disse von Zuben.
 
A cantora Preta Gil completou: "tudo passa pela reeducação da nossa sociedade. Falo por mim. Quem veio aqui hoje, não vai chegar em casa da mesma maneira. A gente teve um choque de informações que modifica a gente como ser humano". A jornalista Lilian Pacce acrescentou: "Do mesmo jeito que as pessoas começaram a se preocupar de onde vem a comida que você come, os jovens estão querendo essa transparência no sistema da moda". A modelo Fernanda Motta afirmou que tem 22 anos de carreira e só há pouco tempo o tema trabalho escravo na moda veio à tona.
 
Na abertura do evento, o procurador-geral Ronaldo Fleury explicou que cabe ao MPT ajuizar as ações contra as empresas que são flagradas expondo seus trabalhadores a condições análogas ao trabalho escravo. Ele destacou que as multas aplicadas, por dano moral coletivo, além do caráter pedagógico ao empresário, são revertidas em favor da comunidade, em ações de conscientização para que a prática não se repita mais. "Todos nós somos afetados quando um trabalhador, um cidadão, ser humano é exposto ao trabalho escravo", disse Fleury.
 
O procurador do MPT Gustavo Accioly esclareceu que a ideia da ação #NãosomosEscravosdaModa surgiu do desejo de conscientizar a sociedade “de que a moda sustentável não consegue ser realmente sustentável com tamanha violação de direitos humanos”. O procurador defendeu o consumo consciente. Durante o evento, além de mesas de debate sobre o tema, os visitantes percorrem ambientes que simulam condições análogas às de escravo em confecções. Estão expostas ainda fotografias com relatos de pessoas resgatadas.
 
O jornalista Leonardo Sakamoto, da ONG Repórter Brasil, destacou que o Brasil tem uma boa legislação de combate ao trabalho escravo, com prisão de dois a oito anos para quem é flagrado e até a desapropriação de imóvel onde é encontrada essa prática. Sakamoto enfatizou que o ato de vestir é um ato político.

Na programação do último dia (23), pela manhã acontece a visita de crianças da rede pública e a mesa-redonda terá como tema a Proteção aos imigrantes e refugiados na inserção laboral. Já na parte da tarde, o assunto é Moda sustentável e inclusão social, com participação da cantora Maria Rita, da modelo Lea T. e do ator Marco Pigossi, sob mediação da apresentadora Astrid Fontenelle.

Para acompanhar as atividades, acesse o facebook do MPT: http://www.facebook.com/mpt.br/

Manifesto #NãoSomosEscravosDaModa

Segundo dados da pesquisa The Global Slavery Index 2018, a indústria têxtil é a que mais explora trabalhadores em situação análoga à escravidão em todo o mundo, perdendo apenas para o setor de tecnologia. Trabalho escravo é tratar o ser humano como uma coisa, um objeto, um bem de consumo descartável. É violar a dignidade do trabalhador e tirar sua capacidade de autodeterminação.

Caracteriza-se não só quando há restrição à liberdade do trabalhador, mas quando há a prática de jornadas exaustivas, condições degradantes em conjunto de irregularidades que configuram desprezo à dignidade humana. Quando colocam em risco a vida e a saúde do operário, violam as normas de higiene, saúde, segurança, alimentação, moradias precárias, dentre outras condições.

O trabalhador não é uma mercadoria. Ele não pode ser recrutado, transportado ou alojado para trabalhar em condições precárias. Essa prática caracteriza crime de tráfico de pessoas para fins de escravidão.

O desenvolvimento sustentável não está associado apenas às questões do meio ambiente natural, mas também ao ambiente de trabalho que a moda representa dentro da cadeia de produção de cada marca. É necessário valorizar cada processo da cadeia têxtil para não alimentar a ganância do consumo inconsciente.

Sobre a Somos Livres

#SomosLivres é uma campanha realizada pela Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo com o apoio do Ministério Público do Trabalho. O objetivo é esclarecer para a população brasileira que trabalho escravo contemporâneo é uma grave violação dos direitos humanos, ferindo diretamente a liberdade e/ou dignidade de trabalhadores e trabalhadoras. Dessa forma, #SomosLivres defende o conceito legal desse crime que é constantemente ameaçado por projetos em tramitação no Congresso Nacional. Mais detalhes: www.somoslivres.org

Fonte: Procuradoria-Geral do Trabalho, com dados da Fundação Walk Free
Informações: (61) 3314-8500
www.mpt.mp.br

Tags: trabalho escravo, Ministério Público do Trabalho

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